quinta-feira, 19 de março de 2020

Resenha: StepSister (Jennifer Donnelly)

“Qual o preço da liberdade de ser quem você realmente é?”


    Falar sobe StepSister não é uma tarefa fácil. A primeira coisa  que eu sinto necessidade absoluta de comentar é o trabalho incrível que foi feito na capa do livro, o que já te faz sentir o tom sombrio da história que será contada. Costumamos dizer que não se deve julgar o livro pela capa, contudo, em casos como desta obra, a capa é uma introdução e um atrativo que condiz muito com a realidade da leitura que Jennifer Donnelly propõe, além de ser belíssima. 
    StepSister, como se anuncia, é um livro de fantasia que se passa no universo dos contos de fadas. É protagonizado por Isabelle, uma das meias-irmãs de Ella - a quem conhecemos, popularmente, por Cinderela. Isabelle e sua irmã são retratadas em muitas versões do conto de Cinderela como as "irmãs feias", pois mesmo rodeadas de luxos, as irmãs sempre eram ofuscadas pela beleza e gentileza de Ella. Além dos personagens já conhecidos (a madrasta, as irmãs, Cinderela, o príncipe), somos apresentados a novas figuras, como as Irmãs Fate, responsáveis por escreverem os mapas do destino da vida das pessoas, Chance, que pode ser descrito como o antagonista às irmãs fate, uma vez que seu grande objetivo é fazer com que Isabelle tenha um desfecho melhor do que o previsto pelo destino, e Tanaquill, a fada madrinha que ajuda Ella a ir ao baile e também a pessoa a quem Isabelle recorre, acreditando que se a fada a fizesse bela, todos os seus problemas desapareceriam, mas é claro que não poderia ser assim tão simples. Além de seus problemas pessoais, a França está passando por um momento de guerra e acompanhamos o desenrolar desse conflito paralelo à Isabelle.


    Se até aqui você está interessado em StepSister, precisa saber que é uma leitura com uma crítica social muito bem trabalhada. Para qualquer pessoa que reconheça os benefícios da beleza na sociedade, é muito perceptível que, apesar de se passar no século XIX, é uma obra extremamente atual. Acompanhamos, a cada página, a agonia de Isabelle e sua irmã Octávia, por não serem bonitas o suficiente para se casarem com o príncipe, mesmo que para isso tenham cortado partes de seu próprio corpo afim de calçar o sapato de cristal perdido por Ella na noite do baile. Porém, mais do que o sofrimento por não conseguirem o casamento, a história reflete constantemente em torno de todas as coisas em que o padrão de beleza interferia na vida das garotas, para o bem ou para o mal. Quantas coisas Isabelle e Octávia poderiam ser se não fossem apenas e simplesmente "feias"?

"Ella que é bonita. Você e eu somos as meias-irmãs feias. E, assim, o mundo reduz, nós três, ao nosso menor denominador comum"

    É automático seguir a leitura relacionando-a com a nossa vida no século XXI. Muitas leitoras podem ter se visto na pele da protagonista por diversas vezes. Ou até mesmo na de Ella. Fato é que a aparência ainda dita comportamentos e oportunidades. StepSister nos leva a acompanhar Isabelle em suas descobertas sobre si mesma, na percepção de que ela não é apenas o seu rosto e ela pode muito mais do que arranjar um casamento por beleza, agradando aos olhos de algum homem, ou apodrecer em uma casa velha, como sua mãe a fazia acreditar. 


sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

As Grandes Sagas e a Conquista de Novos Leitores

O Fenômeno de Arrebatamento Literário em tempos de Internet

      Se você tem entre 12 e 25 anos, é muito provável que já tenha ouvido alguém dizer que é Potterhead ou Semideus. É ainda mais provável que você já tenha dito isso ou algo semelhante. Entre 2011 e 2015 era muito comum encontrar jovens compartilhando suas leituras em seus perfis na internet. Era rotina ver adolescentes com suas edições de Harry Potter (J.K Rowling) e Percy Jackson (Rick Riordan) pelos cantos das escolas ou no transporte público. É considerável que as Grandes Sagas tem um atrativo, nem sempre bem explicado, mas que se pode sentir. Compreendo esse envolvimento como uma sensação de pertencimento, a qual eu costumo chamar de Arrebatamento Literário.

Trecho de edição Ilustrada de "Harry Potter e a Pedra Filosofal"
      Não seria pretensioso dizer que Harry Potter abriu as portas para a Literatura a essa geração, muitas vezes chamada, pelos leitores, de Geração Harry Potter. J.K Rowling construiu um universo tão imensamente mágico que é fácil encontrar pessoas que leram a saga toda em uma semana, imergindo completamente em seu mundo fantástico. Não é diferente no que se refere a Percy Jackson, saga que embarcou na fórmula utilizada por Rowling e ganhou proporções gigantescas conforme os lançamentos de novos volumes.
Livro "Percy Jackson e os Arquivos do Semideus"
A grande diferença entre as duas sagas pode ser observada em seu sucesso no cinema. Harry Potter conquistou público no cinema quase tanto quanto na literatura e esse público logo migrou para os livros. Esse imenso sucesso fez com que, em determinado momento, a autora chegasse a alcançar o posto de segundo livro mais lido no mundo, ficando atrás, apenas, da Bíblia. Já a saga de Riordan, causou uma imensa decepção nos fãs, que não encontraram nos filmes produzidos a mesma conexão que tiveram com os livros - resultado de produções tão infiéis aos livros que muitos se recusam a enxergar como uma adaptação. Apesar disso, Percy Jackson continua crescendo, expandindo sua saga inicial para outros títulos.

      O formato de série literária logo ganhou outros autores e temas e a popularidade foi tão crescente que houve um resgate de séries antigas desconhecidas pelas novas gerações. Não demorou para presenciarmos o surgimento de Jogos Vorazes, Crepúsculo, A Seleção e muitos outros que conquistaram seu público. A grande divulgação na internet tornou perceptível que os jovens se interessam por esse tipo de leitura e em certo momento, passava a sensação de que todos estávamos lendo as mesmas coisas e é disso que se trata o Arrebatamento Literário: Não só estávamos lendo os mesmos livros e assistindo os mesmos filmes, também formamos grupos para debater e teorizar em torno dessas obras. Logo estávamos tão conectados que saímos das páginas e das telas para tornar o contato real. Quantos registros de capturas à bandeira e encontros de bruxos podemos encontrar em uma rápida busca no Google? Esse vínculo e conexão só foi possível pela imersão combinada de leitura, internet e encontros. 


"- Vai ser muito diferente no próximo verão - disse eu. - Quíron espera que tenhamos o dobro de campistas.
- É - concordou Grover -, mas este continuará sendo o lugar de sempre."  


Percy Jackson e O Último Olimpiano


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Impressões iniciais de "I'm not okay with this"

O que esperar da nova série da Netflix? 

       Depois de concluir The Good Place me senti muito órfã de uma série que apresentasse um formato tão agradável de ser assistida. I'm Not Okay With This não preenche completamente esse espaço, pois traz um drama muito maior do que o que vemos em The Good Place (que tem um tom mais leve e divertido nas primeiras temporadas). Entretanto, posso afirmar que a nova produção do streaming tem lá o seu magnetismo. Preciso admitir que tenho certa satisfação em assistir séries com episódios curtos - algo que vem da minha adolescência em que assistia temporadas completas de animes em um final de semana. I'm Not Okay With This traz episódios com cerca de 20 minutos e consegue desenvolver as questões dos episódios sem torná-lo cansativo e sem correr com os acontecimentos. A série é baseada na Graphic Novel de Charles Forsman e sua adaptação para roteiro é feita por Jonathan Entwistle, já conhecido pelo o público da Netflix a partir de The End of The F***ing World.

            

       A trama gira em torno de Sydney Novak - descrita por si mesma como uma "garota branca sem graça de 17 anos" - que tem problemas em controlar e até mesmo compreender sua personalidade e sentimentos. A história se desenvolve em um período posterior ao suicídio de seu pai e é perceptível desde o início o quanto essa perda a afetou. A relação de Sydney com a mãe não é boa, resultando em cenas de ataques verbais mútuos que mostram o quanto as duas se sentem distantes em relação à outra. Em contrapartida, a relação com o irmão mais novo é fofa, mostrando companheirismo e aquela proteção que muitas vezes faz falta quando se retrata adolescentes com irmãos. A melhor amiga de Sydney é Dina, uma garota relativamente popular e é a pessoa mais próxima da protagonista no início da série. no entanto, as coisas mudam quando ela começa um relacionamento com Brad Lewis que, apesar da popularidade, é visto por Sydney como só mais um babaca. O afastamento de Dina leva Sydney a se aproximar de Stanley Barber: um cara meio esquisito que não tem vergonha de ser ele mesmo, marcando presença nos episódios decorrentes. 
     Os episódios iniciais mostram o desenrolar das relações de Sydney e suas descobertas em torno de suas emoções e sexualidade, não muito diferente de séries como Sex Education ou a própria The End of The F***ing World ou . Entretanto, Syd começa a perceber coisas estranhas acontecendo ao seu redor e a se perguntar se ela estaria causando-as. É interessante observar o crescer das manifestações de poder à medida em que as emoções da personagem vão ficando mais intensas e descontroladas. 
       Repleta de referências, que vão desde Carrie: A Estranha a Stranger Things, I'm Not Okay With This é uma série confortável de assistir com seus 7 episódios curtos. Talvez falte um pouco de ousadia, - uma vez que a história é contada de maneira bem simples - contudo, a série deixa espaço para um futuro desenvolvimento em que explore as complexidades dos sentimentos e situações que os personagens vivenciam. Por enquanto, resta esperarmos por uma renovação. Assista ao trailer:














**Todos os direitos reservados à Netflix.

domingo, 23 de fevereiro de 2020

RESENHA: FROZEN 2 (Sem Spoilers)

A Construção da Profundidade Emocional Através da Música

Foto de Divulgação ( © Disney - Todos os direitos reservados)

    O furor que envolve tudo em torno de Frozen é inegável. A fórmula é simples de compreender: personagens cativantes, magia, mudanças glamourosas de vestidos e músicas incríveis. Quando ouvimos falar em animação da Disney®, automaticamente somos transportados para os filmes leves e divertidos de final de tarde. Ao longo dos anos, no entanto, é possível perceber que a Disney® tem investido em roteiros e personagens cada vez mais profundos e complexos do que as simples princesas que são salvas pelos príncipes encantados em alguma floresta cheia de perigos.

Cena do filme Frozen ( © Disney - Todos os direitos reservados)
        Frozen traz todo o encantamento que já é esperado de uma produção desse tipo. Mais do que isso, encontramos músicas dignas de compor as playlists de nossos celulares, vide Let It Go (com bilhões de visualizações no Youtube). Os adultos que se renderam, e se permitiram romper a barreira da Animação, encontraram em Frozen 2 uma evolução surpreendente em relação ao primeiro filme. É possível perceber o crescimento dos personagens de maneira bem clara, e mais do que isso, conseguimos sentir suas emoções com profundidade.

        As canções dessa sequência trazem os ares de musical com muito mais força, elas participam da narração da história muito mais do que no anterior. Além disso, suas composições estão muito mais dramáticas e repletas de significados, reforçando a conexão do público com as emoções dos personagens. Foi a partir das cenas musicais que percebi o quanto Frozen se torna menos um filme infantil. Qualquer pessoa que tenha assistido Anna em The Next Right Thing (por Kristen Bell) sofre junto e percebe o quanto essa canção é poderosa, o quanto ela é significativa para quem está pensando em desistir. Toda a sequência de Elsa com Show Yourself (por Indina Menzel) é tão eletrizante e simplesmente linda, que não consegui desgrudar os olhos da tela enquanto as imagens se formavam, é impossível não se emocionar.

        A Disney® consegue entregar uma continuação digna para os que acompanharam o nascimento desse grande sucesso há 6 anos atrás. Especialmente para quem gosta de musicais, Frozen 2 é um prato cheio. Aguardem por emoção, encantamento e orgulho.